Escola, Aluno, Saberes: Subsídios para repensar  o currículo a partir da Etnomatemática. 

Valter Soares Bonfim  1
Profª. Ms. Emilia Darci de Souza Cuyabano 2

 

Resumo

     Este trabalho tem o objetivo de discutir, questionar e refletir  sobre o conhecimento matemático que o aluno traz para escola e o seu distanciamento com o saber institucional veiculado pela escola. Tomamos como  fio condutor as contribuições da Etnomatemática, vertente  pedagógica da educação Matemática que privilegia o conhecimento oriundo do meio Sociocultural do aluno. Essa pesquisa foi desenvolvida no espaço institucional de uma escola pública de Arenápolis- MT, com olhar para realidade da sala de aula – alunos, professores,  currículo - estabelecendo relações com seu entorno, relatando tudo que pudemos ver , sentir e vivenciar como contribuição para repensar educação matemática voltada para uma visão holística do mundo.
 Palavras chaves:  Alunos, Etnomatemática e Saberes.

    O trabalho em pauta é fruto de mais de dois anos de pesquisas (1998 e 1999), onde evidenciamos discussão, questionamento e reflexão sobre conhecimento matemático que o aluno já tem antes do convívio escolar e que parece não estar incorporado no currículo da  escola. Por isso preocupamos em analisar e refletir sobre este distanciamento do saber que o aluno já traz e o saber institucional existente na escola e suas implicações na educação.
    Neste processo de busca e reflexão, encontrei mais perguntas que respostas, mas elas foram inevitáveis e enriquecedoras visto que minha intenção é contribuir com um pensar  ou re-pensar crítico- construtivo. Assim tomei como fio condutor as contribuições da etnomatemática, vertente pedagógica da educação matemática, que privilegia o conhecimento matemático, ligado ao meio sociocultural do aluno.
     E ao falar em etnomatemática , verificamos em nossas leituras que o termo é a união de várias expressões destacadas por vários estudiosos, sendo sugerido por D’Ambrósio. Ele explica o sentido etimológico da expressão etnomatemática : Etno – sendo aceito como algo muito amplo no contexto cultural, incluindo assim considerações como linguagem jargão, códigos de comportamento, mitos e símbolos; Matema – seria na direção de explicar, e conhecer e entender, e finalmente; Tica  (que vem de tchne) que é a mesma raiz de arte ou técnica de explicar, de conhecer , de entender os diversos contextos culturais.

1 – Graduado em Matemática pela Universidade do Estado de Mato Grosso – UNEMAT/ Campus Universitário Vale do Rio Bugres – Barra do Bugres – MT (autor)
2 – Profª Ms. Pela Universidade Federal  de Mato Grosso (orientadora)
     Nesta pesquisa focalizamos, portanto o olhar para realidade da sala de aula, estabelecendo, a partir daí as relações com seu entorno aqui entendido como tudo aquilo que está ao seu redor e que traz implicações para a prática  desenvolvida.
     Tivemos a preocupação de relatar tudo aquilo que pudemos ver, sentir e vivenciar como contribuições significativa para um repensar da educação matemática voltada para uma  visão holística do mundo e da realidade.
     Participaram deste trabalho alunos da 3ª e 4ª séries do ensino Fundamental da Escola Estadual de 1ª e 2º Graus “Senador Mário Motta”, localizada na Praça 07 de setembro, centro velho, Arenápolis – MT. Foram observados os alunos e respectivos professores. Os alunos na maioria pertencem ao segmento mais pobre da comunidade, formada por três pequenos bairros de Arenápolis- MT. Para salientar que existe uma grande variação de cultura, apontamos também que entre eles, 06 (seis) são da zona rural e de localidades rurais diferentes.
     Ainda para levantamento de dados achei necessário recorrer os registros que são feitos da vida escolar dos alunos, tanto de ordem documental quanto de ordem do cotidiano do aluno, com relação ao aprendizado. Parece-nos muito importante demonstrar e entender a realidade de cada turma ou mesmo de cada aluno em particular. Assim foi analisado: Planejamento e cadernos dos alunos, além das entrevistas com professores e dialogo com os alunos que participaram da pesquisa.
    Observamos  todos os recursos e materiais didático que a escola tem disponível e que de fato existem e tem livre acesso para os alunos e professores. A partir daí, verificamos que a escola em discussão  conta  com um número  razoável de recursos e materiais didático tais como: revistas, jornais, kit tecnológico, espaço físico e alunos com diversos saberes, pois são crianças que precisam batalharem para sobreviverem,  e tudo isso  se analisados podem ser de suma importância no ensino de matemática e outras ciências .
    Assim fizemos questão de relatar e fazer alguns comentários sobre enfoques que nos chamaram atenção tendo em vista a relevância que estes mereceriam se forem utilizados adequadamente, pois estamos tão acostumados a considerar como materiais didáticos apenas cinco itens que são utilizados com maior freqüência  tais como: Caderno, lápis, livro didático, quadro –negro e giz, que fica mesmo difícil acreditar e aceitar que várias outras coisas que existem dentro e fora de uma escola, sejam importante para o aprendizado da matemática, e outras ciências. Todos estes materiais, que deveriam ter uma conexão com o currículo e prática de ensino aprendizagem parecem que não estão incluídos.
     Veja que ao falarmos em currículo, poderíamos nos perguntar: Qual seria uma definição de currículo? D’Ambrósio, (1998. p. 68), define. Currículo é a estratégia para a ação educativa.
     Esta citação leva-nos a refletir sobre os currículos padronizados que circulam nas escolas os quais não atendem a realidade sociocultural, tendo em vista como deveria ser uma proposta de um currículo com compromisso de ensino aprendizagem de qualidade, pois como diz o prof. D”Ambrósio, 1998. p.68. Ao analisar currículo, identificamos seus três componentes: Objetivos, Conteúdos e Método.
     Fazendo uma comparação entre a definição de currículo, e seus três componentes citados acima, com os nossos dados encontrados na etnografia desse trabalho, surge alguns elementos de discussões, a partir do que conseguimos enxergar na averiguação e levantamento que tivemos oportunidades de fazer. Detectamos em nossa análise que os objetivos não estão afinados com os conteúdos propostos que por sua vez não se afinam com os métodos que estão sendo aplicados. Veja que ao analisarmos o planejamento, diário de classe, o caderno de alunos, e o livro didático que foi utilizado, encontramos evidências de que realmente existe um desencontro, pois o planejamento é cópia do programa (índice geral do livro didático) e este planejamento é um tanto sem explicações sobre os métodos que seriam aplicados, para se chegar ao pobre objetivo elencado sem nenhuma amarração. Ainda chamando a nossa atenção temos o diário de classe que os registros é uma seqüência de conteúdos que também tem uma grande semelhança com o livro e planejamento, mas em momento algum o registro de uma atividade nova com estratégia diferente, onde poderiam estar evidenciados a consideração do pensamento , a história, a visão de mundo, o meio cultural e os saberes de cada aluno. Porém o que evidencia é que todos receberam tratamentos iguais e são considerados homogêneos nos modos de pensar, e agir, lamentavelmente encontramos planejamento de um ano para outro com as mesmas características, onde os alunos são outros, o professor é outro, o tempo é outro e no entanto o que se propõe em ensinar é a mesma coisa, fugindo assim o princípio do que necessariamente tem por objetivo um planejamento com compromisso de ensino –aprendizagem de qualidade sempre com olhar direcionado aos anseios  de quem quer  aprender e que já sabe muito. Penso que o professor ao planejar ele deve se indagar, tentando buscar êxito em seus objetivos sendo necessário levar em conta alguns questionamentos.
    Quem é meu aluno? De onde veio? Qual é sua história de vida? Quais são as suas vontades? Para onde quer ir? Para que precisa saber matemática? Que contribuição eu posso lhe oferecer? O que já conhece de matemática? Como é sua família?
    E assim teríamos inúmeros questionamentos  que nos instiga a buscar, entender que objetivos os nossos alunos têm, para planejarmos e traçamos os nossos objetivos, quais seriam os conteúdos necessários para alcançar tais objetivos e que métodos aplicaríamos, pois se não discutimos e procuramos conhecer quem é aquele que se  propõe em aprender (aluno) e o que temos para oferecer enquanto nos propomos a ensinar (professor) podemos cometer um Ëpistemicídio”. (Extermínio do conhecimento dos alunos), como explicava em sua fala professora Gelsa Knijik: mesa redonda espaço aberto no VI ENEM, São Leopoldo – RS 1.998.
     Isto parece muito sério, pois segundo D’Ambrosio explica (1.990 p. 7):

    “Naturalmente manejar quantidade e consequentemente números, formas e relações geométricas, medidas, classificações, em resumo tudo o que é domínio da matemática elementar, obedece a direções muito diferente, ligados ao modelo cultural ao qual pertence ao aluno. Cada grupo cultural tem suas, formas de matematizar. Não há como ignorar isso e não respeitar essas particularidades quando do ingresso da  criança na escola”.

     Assim pensamos e nos preocupamos nesta proposta de trabalho de iniciação a investigação científica que assim  se estruturou, sem pretensão de dar conta da complexidade do fenômeno educacional que envolve fatores sócio econômicos – políticos – culturais, mas julgamos de fundamental importância a reflexão em torno de nossa prática pedagógica, fio condutor que nos guiou nesta linha de investigação.
     Uns fios se soltaram na tessitura da rede do conhecimento outros se mantiveram firmes do início ao fim, outros ainda permaneceram “à espreita”, aguardando novo ato artesanal. Mas o importante é que todos eles  alunos, saberes, currículo, escolas, professores estão ai a nos instigar, a nos provocar...
     Novas perspectivas podem se descortinar a partir do momento em que cada um buscar e assumir que a educação é um ato coletivo e que ninguém faz nada sozinho. Pensar e repensar o currículo de matemática para o ensino fundamental, e médio, a partir da etnomatemática pode ser um primeiro passo.  Iniciou aqui um desfio. Pois é questionável quando ainda temos professores enxergando o ensino aprendizagem dessa forma fechada e cheira de modelos que não mudam, pois como foi possível enxergar em nossa busca, mesmo existindo vários trabalhos com discussões avançadas no sentido da mudança, mostrando que temos de valorizar o conhecimento dos alunos e no entanto os dados etnográfico nos mostraram que isto não está sendo valorizado, e sim que o professor prefere ficar ali seguindo a risca a velha tradição. Precisamos mudar esta situação. Falar sobre o óbvio, é muito difícil pois quem enxerga a escola de longe acredita que tudo está bem, funcionando maravilhosamente e que ela cumpre com seu papel, porém a partir de uma observação mais detalhada sentimos que existe coisas que não estão em sintonia com a nossa realidade, e estas situações desafinadas é que merecem uma atenção especial para obtermos uma escola agradável e que realmente atenda os anseios da comunidade.
 
 
 

 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
 


 

Obs. Necessitarei apenas de retroprojetor  para apresentação.