A Formação Matemática dos Professores de Educação Infantil







Autores: Elaine Sampaio Araujo  (apresentação)
               Manoel Oriosvaldo de Moura
               José Tavares

Proposta do tema escolhido: Grupo de profissionais. Trata-se de colocar em pauta a alfabetização matemática, considerando a história do conceito e o processo de formação dos profissionais responsáveis por sua efetivação na escola.
 

Resumo: Este trabalho pretende apresentar como um projeto pedagógico de matemática,  ao constituir-se como desencadeador e organizador das atividades de ensino; sistematizador do conhecimento e problematizador das práticas docentes, dinamiza e articula a formação profissional dos professores. Trata-se de uma pesquisa desenvolvida inicialmente em São Paulo e que no momento estende-se para Portugal no âmbito do Programa de Doutoramento. Basicamente a construção do Projeto tem sido fundamentada na elaboração das atividades de ensino, realizadas coletivamente, em situações de reflexão sobre a prática, considerando a matemática como construção social.
 

Palavras chaves: alfabetização matemática; formação; projeto
 

Introdução:

 A carência de propostas que enfatizem o processo de construção do conceito de número pela criança, a necessidade de ruptura com um “ensino” de matemática deslocado do processo cognitivo e cultural da criança, a percepção de uma dimensão ético-política da matemática, são questões que tem permeado nossa reflexão enquanto formadores e apontado para a necessidade de sistematização de situações que favoreçam uma aprendizagem significativa, tanto para o aluno como para o professor.
 Nesse sentido, um projeto pedagógico pode apresentar-se como desencadeador e articulador do processo de ensino e aprendizagem enquanto um meio para gerar e gerir as mudanças necessárias no âmbito escolar, constituindo-se como instrumento para o professor, em parceria, pensar e repensar, elaborar e reelaborar sua ação educativa, possibilitando assumir uma “ nova posição”, pessoal e profissional, numa compreensão de projeto semelhante a apresentada por Gilberto Velho: "Relaciono projeto, como uma dimensão mais racional e consciente, com as circunstâncias expressas no campo de possibilidades, inarredável dimensão sociocultural, constitutiva de modelos, paradigmas e mapas". (1994:8)
 Dessa maneira, justifica-se apresentar  a elaboração e a efetivação de um trabalho que, ao contemplar as propostas aqui defendidas, de tirar da marginalidade a escola de Educação Infantil, de estabelecer um novo trato com o conhecimento matemático identificando-o também como construção social e de produzir um projeto pedagógico, torna possível o desenvolvimento profissional  e pessoal dos educadores, bem como o desenvolvimento da escola.
 

Objetivos:

Apresentar indicadores das mudanças na prática docente, que se manifestaram em diferentes momentos da pesquisa, destacando assim, o alcance da proposta para a formação do professor de Educação Infantil, a partir de um projeto pedagógico de matemática.
 Apresentar uma proposta curricular de matemática para Educação Infantil pensada e elaborada pelas professoras onde a pesquisa está sendo desenvolvida.
 

Desenvolvimento do tema:

 A reflexão sobre a prática docente tem demonstrado o quanto tem sido difícil a ocorrência de mudanças significativas na ação pedagógica, quando se trata de Educação Matemática. A não efetivação dessas mudanças impede, por sua vez, a implementação de propostas curriculares que: considerem a negociação de significados; que rompam com a histórica dicotomia entre os objetivos proclamados e os objetivos trabalhados; e que incorporem os elementos considerados essenciais à Educação Matemática, como define Manoel Oriosvaldo de Moura:

 Considerar a urgente necessidade do professor assumir sua nova posição, reconhecendo que ele é um companheiro de seus estudantes na busca do conhecimento, como sugere Ubiratan D’Ambrósio ao se remeter que:  “O futuro da Educação Matemática não depende de revisões de conteúdos mas da dinamização da própria Matemática, procurando levar nossa prática à geração de conhecimento. Tampouco depende de uma metodologia “mágica”. Depende essencialmente de o professor assumir sua nova posição, reconhecer que ele é um companheiro de seus estudantes na busca do conhecimento, e que a Matemática é parte integrante desse conhecimento” (1993, p.14), implica contextualizar quatro princípios pertinentes ao assunto, num terreno onde há muito ainda o que se percorrer.
 O primeiro, relaciona-se à mudança de paradigma: de como ensinar para como se aprende. Professor e aluno aparecem então como sujeitos da aprendizagem, o que sugere uma nova concepção de conhecimento como processo que se constrói na vivência escolar, significando isto o estabelecimento de um novo trato em relação ao processo cognoscente. O segundo princípio, refere-se à retomada, por parte do professor, da posse do ensino, não como dono da verdade, mas como produtor, ou seja, como aquele que vivência o movimento da passagem de cumpridor de tarefas para a de construtor. O terceiro, intimamente ligado ao quarto princípio, diz respeito à natureza do conhecimento matemático, ou seja, de que Matemática estamos falando? Por fim, o quarto remete-nos à definição de educador em Matemática. De acordo com Moura:
Ser educador em Matemática é entender esse conhecimento como um valor cultural. É conhecer os métodos e as leis gerais da Matemática, suas especificidades; como esse conhecimento contribui para a apreensão da realidade. É , ainda, ver cada homem como produtor de conhecimento, ao interagir com outros homens na busca de soluções tanto de problemas que estas interações suscitam, quanto daqueles outros que a Natureza nos coloca como desafios (1990, p.64).
 O conhecimento matemático entendido como uma construção social, como um produto cultural, abre possibilidades para que o aprendiz, seja ele professor seja aluno, se veja como sujeito que constrói, que é capaz de teorizar e confrontar suas teorias e estabelecer relações com outros sujeitos e com objetos.
 É com esse entendimento que desenvolvemos em uma Escola Municipal de Educação Infantil, da zona sul de São Paulo, ações que têm possibilitado a construção de conhecimentos e saberes pelo professor a partir da produção de um projeto pedagógico de educação matemática. Atribuímos a esse movimento uma  natureza formativa no sentido defendido por Tavares (1997): “Na nossa perspectiva de formação como construção de conhecimento e produção de saberes, interessam-nos, sobretudo, as concepções de natureza interactiva, colaborativa e mista que possibilitem o desenvolvimento progressivo e equilibrado dos sujeitos para sua autonomia.” (p.67)
 Na  conclusão, a seguir, procuramos apresentar brevemente a dinâmica que temos utilizado, caracterizando a natureza da pesquisa e  apontando as principais evidências do desenvolvimento profissional por nós identificado.
 
 

Conclusão:

 A proposta de trabalho com o grupo de professoras tem a seguinte dinâmica: colocação de situações-problema, cujas soluções possam conduzir a elaborações de novos conhecimentos, referentes não apenas a determinados conteúdos, mas à própria prática docente. Estabelecemos ações a serem desenvolvidas com o grupo, que permitissem instrumentalizá-lo para o exercício de sua profissão. Essas ações têm possibilitado aos professores:

 O desenvolvimento da formação assinala como pressuposto situações de debates, perpassadas por atitudes de colaboração e de conflito sócio-cognitivo, atribuindo à mediação do outro papel fundamental nesse movimento de aprendizagem da profissão docente. Melhorar a prática docente, percebendo o desenvolvimento profissional dos envolvidos, firmou-se como expectativa recíproca entre os participantes do projeto, compreendido como uma pesquisa colaborativa, configurando-se assim, como uma pesquisa de natureza co-responsável, ou seja, um trabalho de investigação e reflexão entre parceiros, com diferentes experiências e responsabilidades, visando o intercâmbio e ajuda mútua no processo de formação profissional. Apresentar os alcances dessa pesquisa é a intenção desse trabalho.
 

Referências bibliográficas
 

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Elaine Sampaio Araujo (esaraujo@dce.ua.pt)
Manoel Oriosvaldo de Moura (modmoura@usp.br)
José Tavares (tavares@dce.ua.pt)