CO21: Interpretação de gráficos por alunos da 8ª série de diferentes redes de ensino.
 

Roseline Nascimento da Silva
Aluna bolsista do Programa de Iniciação Científica do curso de Pedagogia

Liliane Maria Teixeira de Lima
Professora Orientadora, Mestra em Psicologia da Educação Matemática, Departamento de Administração Escolar e Planejamento Educacional, Universidade Federal de Pernambuco

RESUMO

Analisou-se a interpretação que estudantes de 8ª série de diferentes redes de ensino atribuíam a gráficos da mídia impressa. Buscou-se identificar como  ações pedagógicas das redes influenciariam as interpretações obtidas. Entrevistou-se alunos de escola  particular e pública utilizando-se três gráficos selecionados de impressos. Os alunos realizaram leituras matemáticas (estratégias diferenciadas), experienciais e visuais nas abordagens iniciais. Na escola pública obteve-se interpretações mais associadas a comentários em detrimento à escola particular, onde evidenciou-se mais estimativas.

PALAVRAS-CHAVE: Interpretação, gráficos e redes de ensino.

INTRODUÇÃO

A despeito das inovações curriculares e didáticas no âmbito da Educação Matemática, observa-se que o modelo tradicional de ensino ainda impera na maioria das escolas. A forma como os professores efetivam os conteúdos em relação a interpretação de  gráficos, por exemplo, apresentam-se inseridos numa perspectiva tradicional, centradas na análise metódica de regras sintáticas, descrição de eixos e leitura de coordenadas. Nesta perspectiva, os gráficos são abordados como algo que possui uma única interpretação.
O tratamento da informação pela mídia impressa por meio de gráficos que retratam relações entre quantidades é um procedimento que vem se tornando usual. A exploração da interpretação que  sujeitos escolarizados fazem desses modelos matemáticos, é de interesse da comunidade científica (Meira, 1996; Monteiro,1997; Lima,1998). Os gráficos veiculados pela mídia impressa apresentam os eixos ortogonais  expostos ou não  no plano cartesiano, além disso, a produção das escalas não obedece necessariamente o formalismo matemático veiculado nas escolas.
Lima (1998), por exemplo, retrata a ênfase que os meios de comunicação de massa fazem do uso de gráficos e como os mesmos são representados sem uma preocupação com regras matemáticas. Os gráficos são apresentados com bastante recurso visual, efeitos de degrade, perspectivas bi ou tridimensional, associação de cores e desenhos. A representação gráfica, muitas vezes, vem ofuscando determinados aspectos das mensagens, apresentando desvios nos padrões métricos, imprecisões e desproporcionalidades entre a representação e os dados de origem. Aspectos estes que contribuem para que o contexto da mídia impressa se constitua num poderoso ambiente para a  exploração dos processos cognitivos relativo ao que cada indivíduo já possui.
Ao investigar a interpretação de gráficos da mídia impressa por participantes de diferentes grupos sociais Lima (1998), verificou processos cognitivos complexos, podendo ser destacados a esse respeito os diferentes tipos de leituras e de estratégias para o tratamento das quantidades. Aspectos estes que não emergiram numa apreensão direta mas como algo que sofreu mediações dentre as quais pode ser destacado o conhecimento e experiência prévias dos sujeitos para lidar com quantidades.
Entende-se a interpretação de gráficos a partir da perspectiva de Lima (1998) e amplia-se, no estudo relatado, uma análise para o papel da cultura escolar como limitadora ou possibilitadora de interpretações efetivas por parte dos alunos, buscando contribuir para uma análise real e concreta das ações pedagógicas das escolas no processo de formação dos alunos.

OBJETIVO

Analisar a interpretação de gráficos da mídia impressa por estudantes da 8ª série  de diferentes redes de ensino, buscando investigar a influência dos aspectos institucionais sobre a didática da matemática no que concerne ao ensino desse domínio específico.

METODOLOGIA

O Estudo foi desenvolvido com dezesseis alunos, sendo oito de escola pública e oito de escola da rede particular de ensino, os quais foram entrevistados a partir de entrevista clínica, com a duração em média de duas horas cada uma, realizadas no próprio ambiente escolar.
A atividade de pesquisa envolveu a utilização de três gráficos da mídia impressa selecionados das revistas VEJA e ISTO É e todo o processo foi gravado a partir de recurso em áudio. Serviram como fonte de dados para análise do desempenho dos alunos na interpretação dos gráficos: o Projeto Político - Pedagógico das escolas e os planos  e programas de matemática, em especial os que se referiram direta ou indiretamente, ao tratamento da informação.
Os dados obtidos foram analisados: a) numa perspectiva do diagnóstico das escolas selecionadas para o estudo; b) das interpretações dos alunos num contexto de resolução de problemas a partir da utilização de tarefas gráficas.

RESULTADOS

Constatou-se, com base nos dados obtidos que os alunos realizaram diferentes tipos de leituras aos gráficos, cujas abordagens envolveram os seguintes aspectos: matemáticos e visuais representados e aspectos relacionados com o conhecimento prévio sobre o conteúdo retratado, leitura denominada de experiencial.
Evidenciou-se uma maior freqüência de leituras matemáticas nas interpretações dos alunos de ambas as redes de ensino (56%). Este resultado reforça os dados obtidos nos estudos de Monteiro (1997) e de Lima (1998). As leituras visuais tiveram uma freqüência de 26% do total de leituras realizadas pelos alunos, seguidas de 18% de leituras experienciais.
Estes resultados colocam em evidência o fato do gráfico se constituir num sistema matemático visual de representação de relações entre quantidades. As leituras experienciais emergiram como justificativas para os dados matemáticos. As leituras visuais, por sua vez, estiveram mais associadas às dificuldades de entendimento dos alunos para aspectos representacionais e relacionados a intenções subjacentes e que envolvem processos de interação na comunicação autor do gráfico-leitor.
As leituras matemáticas realizadas pelos alunos envolveram estratégias de tratamento das quantidades que se apresentaram diferenciadas quando comparadas em relação às redes de ensino envolvidas. Os alunos da escola pública utilizaram uma maior freqüência de comentários (65,5%), seguidos de 20,7% de abordagens que não puderam ser categorizadas e 13,8% de estratégia do tipo estimativa. Os alunos da escola particular utilizaram uma maior freqüência de estimativas (62,5%), seguidas de comentários (33,3%) e 4,2% de abordagens que não puderam ser categorizadas. As abordagens iniciais que não puderam ser categorizadas quanto a estratégia de tratamento das quantidades envolveram respostas que incluíram apenas leituras do tipo experiencial e/ou visual.
 
CONCLUSÃO

Tendo em vista que interpretar gráficos da mídia impressa envolve processos complexos, emergindo de diferentes tipos de leituras, a formação escolar do aluno pode contribuir para ampliar ou limitar o seu desempenho na compreensão das informações.
O tratamento da informação realizado por ambas as escolas se configurou enquanto processo relacionado com o desenvolvimento da capacidade de resolução de problemas, sendo trabalhado a partir de aulas expositivas, atividades em grupos e interpretação de textos. Tendo como objetivo específico para o conteúdo de gráficos, identificar relações entre duas grandezas reconhecendo-as e analisando-as a partir de diferentes representações (barras, linhas, diagramas). De modo similar, as duas escolas não efetivam as propostas evidenciadas pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN, 1997), no que se refere ao tratamento da informação.
O diferenciador entre as escolas encontra-se no fato de que a rede particular de ensino utiliza recortes de gráficos apresentados em jornais e em revistas, tendo como objetivo a realização de  interpretações. Este aspecto se constituiu num conhecimento prévio disponibilizado pelo aluno e que provavelmente pode ter contribuído para emergência de estratégias mais sofisticadas para realizar o tratamento das quantidades.
Reconhece-se a necessidade do desenvolvimento de seqüências didáticas que auxiliem o professor a aprimorar a interpretação de gráficos da mídia impressa  pelos alunos, o que a escola particular já realiza, embora de modo assistemático. Dessa forma, este estudo sugere que a inclusão do ensino do tratamento das informações na mídia impressa a partir do uso de gráficos, pode ser eficiente no aprimoramento desta habilidade. Sendo este aspecto ressaltado no que concerne a rede pública de ensino, uma vez que os alunos da escola pesquisada apresentaram nas interpretações iniciais aos gráficos estratégias de tratamento das quantidades pouco elaboradas e centradas em comentários e/ou descrições de dados quantitativos, sem, contudo, aprofundar as suas análises, requerendo para isto de intervenções específicas por parte da pesquisadora.
A partir do diagnóstico das escolas, portanto, pode-se perceber que os ambientes escolares se constituíram como elemento de influência na relação ensino-aprendizagem dos educandos. O processo didático implementado pelas escolas se revelou como elemento definidor para a construção e elaboração do conhecimento de gráficos por parte dos alunos.

BIBLIOGRAFIA

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