Resumo
Abordamos Matemática, Educação Matemática
e Etnomatemática como objetos distintos mas interligados.
A Matemática da escola, a Matemática pura e a aplicada são
vistas sob a ótica da Etnomatemática e como fundamentais
para a autonomia de um pais. Propomos junto com outros autores a mediação
de grupos segundo a cultura e o grau de marginalização para
integração à sociedade mantendo suas raízes.
Comentamos no final alguns trabalhos já realizados nesta área.
Há no entanto estratégias a serem implementadas e recursos
a serem adquiridos.
PALAVRAS-CHAVE : Educação, desenvolvimento, exclusão
INTRODUÇÃO
A presença da Matemática em atividades do cotidiano
(comércio...) na tecnologia e na ciência implica na
educação continuada referente a transmitir este conhecimento,
e absorver os novos, oriundos de pesquisas na matemática pura
e a aplicada e como o necessita a ciência e a tecnologia (C&T).
É difícil conceber um povo que prescinda da C&T para
sobreviver. A sociedade denominada ‘High Tech’ é um estágio
buscado pela totalidade dos países para o exercício da comunicação,
otimização e automação; a informatização
invadiu desde atividades ligadas a alimentação até
pesquisa sobre a estrutura de funcionamento do homem através do
estudo de códigos genéticos, passando pela arte e o lazer.
Este desenvolvimento tem sido mal administrado resultando num fator de
exclusão de grupos urbanos e até mesmo de países e
ocorre numa velocidade espantosa e de difícil controle. Postos estão
portanto os problemas de desenvolvimento e de exclusão. Este quadro
leva hoje mais do que nunca a considerar o ensino o centro nevrálgico
do enfrentamento. No nosso país consideram-se críticos sua
autonomia e a qualidade de vida dos habitantes. Há portanto muito
o que fazer. A integração de grupos étnicos assim
como o avanço tecnológico de um pais (ou grupos de países)
leva a certas considerações que ultrapassam a relação
aluno-conteúdo. Vários trabalhos tem sido feitos a nível
empírico ver [6], [4] e[9] sobre o ensino da matemática.
Porém a identificação e reconhecimento do aspecto
étnico local não basta. Com este termo reforço o aspecto
de que a consideração de um grupo em especial conduz a uma
situação local não refletindo assim o global do problema.
A problemática do ensino da Matemática ultrapassa cada grupo
em particular. Buscar a unidade dessa diversidade de aspectos étnicos
evita a unilateralidade e a perda do horizonte e do sentido de direção.
Para me referir a casos que mais vivencio atuando no ensino do terceiro
grau no curso de Matemática creio que o trabalho de base na licenciatura
pode contribuir para um estado de alerta por parte do futuro professor
inserindo discussões temáticas. Mas o pais necessita dos
recursos humanos que a Academia pode gerar. Assim a relação
Universidade –escola e atividades de extensão emergem como fundamentais
desse ecossistema ,desse nó borromeano cujos anéis são
Matemática, Etnomatemática e Educação Matemática.
OBJETIVOS
O objetivo maior deste trabalho é contribuir com reflexões
sobre a problemática da Etnomatemática na sua versão
crítica ‘vestindo a camisa’ e buscando contatos diretos com outros
interessados nas áreas do “nó”. Tenho consciência do
momento de construção emergente. Precisamos exercitar paciência
e coragem frente a críticas e incompreenções. Mas
sinto a força da sintonia à qual pretendo somar esforços.
A identificação dos objetos
Educação Matemática
A Educação Matemática vem se constituindo
como um novo objeto de saber . Não é nossa intenção
discutir se está ou não cristalizada. Já sendo formulada
na pós-graduação através de mestrados e doutorados
acreditamos que num futuro próximo seja estabelecida uma graduação
o que irá decretar simultaneamente sua existência e seu futuro.
Suas bases estão fundamentadas de forma objetiva originada em problemas
de ensino da Matemática, embora espraiada sobre vários campos
do conhecimento. Este aspecto dificulta uma concepção geral
e também a formação no sentido de conteúdo
‘vertical’. Alguns professores de Matemática que no exercício
de sua vocação desenvolvem atividades extra curriculares
classificam sua atuação como Ensino de Matemática
. São profissionais com conteúdo especifico e que não
acham conveniente excursões mais abrangentes para novas perspectivas
ou ampliação de horizonte. Temem a dispersão. No entanto
vemos que hoje não há linearidade que dê conta de uma
área de conhecimento como a Matemática Não se
trata portanto de enfrentar problemas de ensino na Matemática com
enxertos de suas próprias partes. Por vezes este encaminhamento
leva ao surgimento de disciplinas com necessidade presumida acolhidas freqüentemente
de modo acrítico. (Machado [2] pg. 179). Ainda Machado (idem pg.
181) cita Roland Barthes (No rumor da língua) que considera a possibilidade
da Interdisciplinaridade como construção de um objeto
novo. Este ponto é crucial em Educação Matemática
pois ela envolve disciplinas já estabelecidas a exemplo da própria
Matemática , psicologia e da pedagogia das quais ‘nenhuma consente
em abandonar-se’. Trata-se então de construir a Educação
Matemática como um novo objeto.
Matemática
A Matemática não subsiste sem aplicações.
Sua relação com as ciências ( a física por exemplo)
lhe transmite a lucidez necessária para não ser um simples
jogo formal . Já a filosofia pode lhe dar a consciência do
que faz : questiona seus métodos , seus objetos (conjunto infinito
etc.)e seus axiomas ( ponto de partida por vezes intuitivo).Seria incorreto
considerar que o desenvolvimento deste campo seja devido (mesmo hoje)
a questões internas. Com Newton tomou corpo a física Matemática
o que permitiu o desenvolvimento de máquinas. O empirismo na época
era uma escola filosófica imbatível pois novos experimentos
resultavam em novas leis propostas. O conhecimento científico tornou-se
a ‘via da verdade’ . O homem acreditou que podia conhecer o
universo e suas leis. As formulações de Lagrange , Hamilton
são estudadas como a descrição da mecânica do
universo. No entanto as ‘questões internas’ da Matemática
são de profundo valor. O problema do 5° postulado era
interno por ser de ordem axiomática. Como sabemos, estes estudos
culminaram no surgimento das geometrias Não-Euclidianas da qual
a teoria da relatividade é tributária. Várias outras
questões internas propiciaram o desenvolvimento da Matemática
tendo posterior retorna a aplicações ,inclusão a medicina.
Não há sentido em ver a Matemática como linguagem
da ciência pois o matemático ‘arruma’ a casa numa tarefa de
investigar o que ainda não está claro ou resolver problemas
postos por situações as mais diversas. Este ferramental
não pode ser reduzido a um papel de texto descritivo
ou de apoio tão simplesmente.
Não podemos nos pautar em caracterizar todo o esforço
e volume de ensino de ciências e Matemática apenas com o objetivo
de desenvolver mentes . A educação do indivíduo num
pais de periferia como o nosso deve ser direcionada para uma perspectiva
de desenvolvimento e de libertação econômica e cultural.
Etnomatemática: A prática Matemática não
é Universal , mas Etno Dependente
Com este título polêmico, por ferir o mito da Matemática
universal, pretendo somar as atenções a diferentes óticas
de trabalho com a Matemática. Tanto Freire quanto Vygotsky e Luria
apresentam material substancial para uma analogia da concepção
de Etnomatemática através duma etnolinguistica. Em Luria
[10] pg. 29 temos uma citação: a língua de alguns
povos, que estão num nível baixo de desenvolvimento cultural,
é difícil de entender sem o significado da situação
na qual se pronunciam as palavras dadas. Portanto , é impossível
entender de que fala essa gente estando na escuridão , quando não
se pode ver a situação nem os gestos. Ora percebemos num
país como o nosso, multicultural e descultural como a Rússia
de Vygotsky e Luria que há camadas da população que
falam o português-situação. Também seu conhecimento
de Matemática é de situação. Não trabalham
a estrutura. Habitantes de um povoado pesquisado por Luria classificaram
os objetos por sua função e não pela forma ou características.
Assim os objetos similares são os de uma mesma tarefa : machado
,serra e lenha. Troncos isoladamente ou o machado em si são
objetos órfãos. Também foi observado um fato relevante
para a questão do ensino : a região do cérebro ativa
ao se fazer um calculo em Matemática é diferente no engenheiro
e num homem de pouca instrução. Isto tem de ser investigado
nas suas conseqüências.
A mediação : não há mais sociedades extrativistas.
A matéria prima tem baixo preço no mercado internacional
(pertence ao quarto mundo ,a pequenas comunidades ): hoje a meta é
produção de alimentos , industrialização e
tecnologia.
Se considerarmos que a Matemática Acadêmica tem
projetos de consultoria para indústria e tecnologia podemos inferir
daí que “todo país tem uma Matemática própria”
. Esta afirmação leva em conta que certos itens de pesquisas
são dirigidos a desenvolvimentos próprios de um país
e que a Matemática se desenvolve intensamente quando acoplada à
questões objetivas. Naturalmente que acoplado a este desenvolvimento
matemático está um grupo econômico que pode ser o próprio
Estado. Por exemplo , a Petrobrás desenvolveu junto à UNICAMP
e à UFRJ a tecnologia de perfuração de águas
profundas. O Japão é avançado em tópicos matemáticos
como abalos sísmicos devido à quantidade de vulcões
na sua superfície ou que estejam próximos a sua tecnologia.
Se um pais não tem sua própria Matemática , se não
é líder em nenhum de seus campos, é porque é
economicamente e culturalmente dependente. Talvez seja forte o termo
‘Matemática própria’ e mais conveniente seria o termo ‘escola
própria’ ou ‘escola de tal país’.
Estas reflexões levam em conta que :
A Matemática esclarece pontos importantes da tecnologia e outras
aplicações assim como contribui para seu desenvolvimento.
2- O desenvolvimento de um pais é dependente da sua qualidade
universitária
O binômio Cultura e desenvolvimento é vital para
o programa da autonomia de um país
Os currículos dão cunho de universal a Matemática
. Na verdade , há só uma aparência apenas porque se
o objeto de estudo é o mesmo ,as características específicas
de cada país têm uma influencia na formulação
de programas que dependem da estrutura educacional de cada país
. A seqüência escolar sendo diferenciada ,provoca programas
distintos assim que um indivíduo que se desloque de um país
a outro nesta faixa de estudo teria de sofrer uma adaptação
. Bem entendido esta adaptação ocorre mesmo na situação
mais profissional das instâncias de mestrado e doutorado. Assim ,
estuda-se Matemática nas escolas do mundo inteiro. Há Matemática
em todos os currículos, a mesma na sua essência , porém
diferenciada por fatores socioculturais .
A educação de grupos étnicos onde se intenta a
integração também leva encruzilhadas. Um país
desestruturado não tem condições de tratar com qualidade
a cultura e o social . Isto dificulta por exemplo , a execução
de programas com índios com grupos rurais assim como grupos urbanos
de excluídos. Para o país adquirir tal estrutura tem de desenvolver-se
e para isto recorrer a métodos ansiolíticos. Preservar a
cultura resultando num quadro estático de um grupo pode ser um meio
fácil de destrui-lo. Hoje vemos o índio ter de se integrar
a vida ‘civilizada’ para sobreviver. A demarcação de terras
não tem sido cumpridas a ponto de permitir a manutenção
de sua cultura e praticas econômicas. Muitos dos grupos são
hoje pobres por terem se integrados na cultura civilizada. Neste caso como
manter a etnia e sobreviver? Nosso próprio país não
tem autonomia. È um misto de mediar para integração,
ensinar para a autonomia e se atualizar mantendo o ritmo de estudo em Matemática.
CONCLUSÃO (ÕES)
Nesta conclusão que é apenas um começo teço
comentários sobre alguns textos consultados sobre a Etnomatemática.
Os trabalhos resultantes de pesquisa em campo (Knijnik [4], Rol de Teses
[6]) constatam o uso diferenciado da Matemática por parte de cada
grupo. Naturalmente estes mesmos grupos podem ser mediados para apurarem
seu trabalho no que concerne a mais recursos. Consideremos um exemplo.
Há empreiteiros que fazem um telhado com 30% de caimento(este
é um padrão na região dos lagos no Estado do Rio).
Com isto ele conhece a que altura estarão o topo do telhado(que
vai ser arbitrado) e a sua base onde ele recorre ao caimento. Se o telhado
tem 5metros ele cairá 1,5m. No entanto este mesmo operário
não saberá calcular que peso máximo suporta a coluna
tal (de madeira ou concreto) . Nas pequenas cidades encontramos muitas
construções que afundam no solo , que tem umidade e outros
problemas. Se por um lado muitos engenheiros e arquitetos trabalham com
‘tabelas’ sem um real domínio para fugir ao padrão e criar;
o fato é que os recursos de um engenheiro civil e de um arquiteto
permitem personalizar uma construção usando o suficiente
de material de forma segura, com boa ventilação e estética.
Este exemplo é da natureza dos grupos em Abreu [6], Borba [6]
Carvalho [6]e Grando [6]. Estas pesquisas se acoplam com trabalhos
como em Monteiro [6], Souza [6] e Frankenstein [1]. Em Nobre [6] encontramos
uma situação inerente à massa desenformada de países
como o nosso , que diariamente caem em armadilhas sob o peso das quais
sucumbem financeiramente além de votarem no ‘voto útil’ que
algumas pesquisas de intenção induzem. Em Borba [9] e Pompeu
[6] encontramos ‘muito o que fazer’. Creio que muitos que são atentos
à Etnomatemática procurarão se munir de recursos para
tornar suas aulas mais eficientes e agradáveis. Podemos pensar em
apresentar ‘os urbanos’ às atividades do campo ,da marcenaria da
mecânica para que vejam a Matemática funcionando na vida.
Alguém já declarou que ao tentar isto o professor de Matemática
seria ‘massacrado’ pois além da Matemática ele ainda tenta
‘levar os alunos para um mundo distante e do qual tem preconceito’.
O mundo hoje detém um tecnologia jamais imaginada. Sabemos quão
difícil é distinguir ficção científica
e ciência. Porém não podemos nos resumir a admirar
efeitos especiais nos filmes nem nos reduzirmos a consumidores da informática
seja através de produtos individualizados ou de utilização
na escola. Melhor será que os filmes voltem a falar de temas da
sociedade onde vejamos valores no centro das telas e não a violência
justificada por valores de mercado , do que vendem mais. Há muito
o que se conhecer de cada povo : sua cultura sua lição histórica.
Sua arte , seu idioma , sua Lógica e sua Matemática. Devemos
resgatar a etnia e o conseguiremos. Porque no fundo ,pronunciar certas
palavras típicas de nosso idioma nos faz bem ,como nos alimentarmos
com aquele tempero de nossa cultura. Mal conhecemos nossa cultura ocidental
e ela já está ameaçada de se tornar linear. Não
é com o subterfúgio de uma Matemática universal ,
de uma ciência –tecnológica de mercado que estamos a exercer
nossos votos nobres contidos nos ideais de professores. Lecionar
é sobretudo aprender numa caminhada conjunta. Uma socialização
de mercado permite , num mundo menos agressivo e mais cooptado que países
novos emirjam. Esta é a riqueza que podemos esperar a desfrutar
.para isto temos de lutar por sua realização. Com cultura
e desenvolvimento podemos construir um mundo variado, múltiplo e
uno.
BIBLIOGRAFIA
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Editora Moraes
[2]- Machado, Nilson José, Epistemologia e Didática,
Cortez Editora
[3]- Machado, Nilson José, Matemática e Língua
Materna, Cortez Editora
[4]- Knijnik, G., Exclusão e Resistência: E M e
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[7]- D'Ambrósio, Ubiratan, Etnomatemática EM em Revista
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[10]- Luria, A. R. , Pensamento e Linguagem, Editora Artes Médicas
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