Uma antropóloga na aula de matemática

Heloísa Pires Lima

Se a diversidade é uma sabedoria da natureza, por que como produtores de cultura , esquecemos disso?
Na sala de aula, encontramos alunos e mestres que possuem as mais diversas referências sobre si e sobre o mundo. E este é um espaço de extrema riqueza para a ampliação desse conhecimento.
A escola como um todo deveria estar atenta ao sistema de significados e costumes que circulam nesse ambiente.
Quando pensamos em currículos, padrões de avaliação, numa disciplina como a Matemática, devemos ter a plena consciência de que ela é fundamental na formação dos cidadãos. Principalmente para as relações de trabalho numa sociedade tecnológica. As demandas de um mundo globalizado desafiam as nações, quanto a sua viabilidade econômica e científica. O milênio abre com uma preocupação central, quanto aos índices do analfabetismo matemático. A disciplina é considerada base e o sustentáculo para o desempenho de uma elite tecnologicamente produtiva.
Como então,  desenvolver o pleno potencial do aluno que por sua vez fortalece toda uma sociedade?
Na prática, ao examinarmos um educando de sucesso nessa área, é fácil concluirmos que pode ter havido reforço positivo na sua relação com a disciplina ou que tenha , de alguma forma, sido motivado para o rendimento.
Como será que funciona, nessa estrada de conquistas, seu orgulho quanto à sua identidade cultural, auto - estima ?
Porém, também é notório que no exercício de educar, reconhecemos as muitas desigualdades quanto ao tratamento dado aos diferentes alunos da lida diária.
Se pensarmos nas questões de gênero, influindo nesses comportamentos, podemos apontar a orientação machista presente na disciplina. Ou então, por que os cursos politécnicos estiveram por décadas a freqüência masculina arrebatadora? Haveria alguma variável na sala de aula, quanto ao incentivo destinado à meninas e meninos?
Uma percepção tão simples,  tão óbvia, nos remete a questão da equidade das atitudes frente às diferenças presentes na sala de aula. Se focarmos, mais objetivamente, as diferenças étnicas de nosso conjunto cultural, teremos que perguntar se ela é realmente problematizada a sério. Entre os fatores que passam por uma potencialização adequada para a aprendizagem, necessariamente precisamos rever os valore étnicos além dos éticos.
Por essa estrada, podemos focar  os currículos, que por sua vez são organizados e aplicados por uma comunidade.
A sala de aula é pobre quanto ao conhecimento a respeito da diversidade humana. Nos limitamos a paradigmas genéricos e eurocêntricos. A representação da diferença ao mesmo tempo a qualifica.
O que dizermos então do racismo que atua barbaramente no nosso cotidiano, segregando crianças, adolescentes e os próprios professores.
O assunto é difícil. Geralmente é mais fácil silenciar sobre o tema. Se não, vejamos a invisibilidade para as referências negras na Matemática como atividade humana.
Imagine agora, uma criança negra que é lembrada apenas, quando o assunto escolar é a escravidão? Não que essa deva ser uma memória mas, a única?  Toda a visão colonialista, imperialista , historicamente construída, prevalece no material disponível mas, principalmente na ausência de material de apoio adequado para esse trabalho. O mundo negro africano, transborda lógicas e formas que poderiam estar mais presentes como um presente para esse aprendizado. Não apenas, para o caso negro mas, cadê as referências às populações indígenas e outras?
Se a escola, e mais especificamente a sala de aula, deve ser um local de apoio que encoraje os alunos a explorar, conjeturar, raciocinar e tomar decisões, estimuladas por um ambiente rico em possibilidades, então, há muito a se fazer.
É preciso preparar estratégias para uma educação mais inclusiva. O planejamento em conjunto com demais disciplinas, e mesmo para a condução de metas voltadas para a auto-estima, podem estar conectadas a objetivos específicos de área.
A mídia age poderosamente para as opiniões dos professores e alunos.  Seria necessário oficinas onde se refletisse racismo e toda a forma de discriminações mantenedoras das desigualdades.
Enfim, se cada indivíduo, grupo, sociedade, período, contexto responde de modo diferente à mesmos desafios, isto nos dá a certeza de que somos os mesmos humanos diferentes e iguais no direito a sermos diferentes e que temos muito a aprender com toda esse conhecimento multiplicado.
Bibliografia
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