Sob a coordenação do Ministério da Ciência e Tecnologia e alinhavado por uma equipe de especialistas da área de tecnologias da informação e da comunicação foi lançado no final de 1999 um conjunto de documentos para subsidiar uma urgente e necessária discussão sobre a elaboração de um programa nacional, capaz de inserir o Brasil na chamada Sociedade Global da Informação. Trata-se pois de um programa oficial em sintonia com o Plano Plurianual 2000-2003, visando atuar em dez áreas prioritárias, a saber: Ciência e Tecnologia; Educação, Cultura, Saúde, Aplicações Sociais, Comércio Eletrônico, Informação e Mídia, Atividades de Governo e Educação para a Sociedade da Informação. É de se notar a participação direta e indireta da Educação entre as prioridades desse programa, que mesmo ganhando ou talvez por isso mesmo- a alcunha da informação, acolhe-a com um sentido que lhe é bastante particular, a distância. É fato que a rede mundial de computadores tem conquistado muito espaço na mídia, especialmente desde a segunda metade da década que se encerra. De um tímido projeto acadêmico gestado na FAPESP, que se disseminou pela Rede Nacional de Pesquisa, a internet brasileira é hoje um dos nós mais movimentados da rede no cenário mundial, com uma crescente e desmedida ênfase nas relações comerciais. Essa explosão é acompanhada por um vigoroso aumento da largura de banda em conexões com o exterior, notadamente com os EUA, e um pálido e inconstante crescimento da capilaridade no Brasil, conforme pode-se observar a partir dos relatórios produzidos pela RNP. Apesar de não serem conceitos antagônicos, largura de banda e capilaridade têm se comportado como opções concorrentes dentro do quadro de crescimento da internet brasileira. Onde os recursos para investimento são escassos, as prioridades disseminam disputas de interesse entre grupos aliados a um ou outro conceito. A tímida infiltração das linhas de conexão nos pontos de presença potenciais, onde a concentração humana é alta, pode causar a médio prazo a estagnação do processo de implantação dessa tecnologia no país, pois na medida em que os serviços da rede atendem a uma parcela reduzida da população, suas aplicações serão restritamente desenvolvidas visando as demandas dessa parcela. Se as demandas sinalizam para o aumento da largura de banda, seu atendimento será concorrente do processo de capilarização da rede, cujos serviços poderiam atender a uma parcela maior da sociedade. Quando se fala em educação, as conseqüências da concorrência entre largura de banda e capilaridade são ainda mais perversas. Ao priorizar o investimento de recursos para a implementação de projetos de EAD para formação de quadros qualificados nas universidades, centros de pesquisas, hospitais e bibliotecas universitárias, demandando grande largura de banda para atender poucos, certamente as escolas e suas bibliotecas continuarão desconectadas da rede, deixando de atender muitos.
O documento base do PBSI sugere a constituição de uma ampla agenda educacional, como requisito fundamental para a construção de uma sociedade baseada no conhecimento. Não é fácil discordar dessa prioridade. O que se torna insustentável diante dessa proposta é restringi-la à formação de quadros altamente capacitados por meio de ensino a distância. Tal agenda, tendo em vista a necessária adesão dos projetos financiáveis aos termos do documento, não contemplaria de modo algum a pretendida amplitude. Uma agenda educacional ampla deve agregar todos os níveis de formação, sob o risco de agravar um histórico processo de exclusão que caracteriza nossa sociedade, pois é por meio do acesso às inovações no sistema público de ensino e nos níveis mais básicos de ensino que se combatem as desigualdades com mais eficiência. Nesse sentido, o programa precisa adotar uma política de formação de cidadãos visando também as escolas, numa perspectiva de integrá-las à rede para o estabelecimento de relações de cooperação, que é certamente uma prioridade não restritiva. Deve-se também incentivar o desenvolvimento de aplicações da rede voltadas para a modalidade presencial de ensino, baseada em sistemas de autoria capazes de promover a criação colaborativa intra e entre escolas. Há pelo menos duas linhas de aplicações de rede, que podem e devem ser integradas num programa especialmente desenhado para escolas: uma prevendo a atualização e formação de professores; outra voltada para os aluno. Experiências recentes naufragaram por desprezar o papel essencial de requalificação dos professores, quando propostas de inovação são levadas às escolas. As mudanças ocorrem de forma cada vez mais acelerada e não se pode colocar em ordem de sucessão essas linhas. O desafio está em engendrá-las dinamicamente, considerando que ensinar e aprender compartilham cada vez mais competências comuns. Precisamos nos integrar a sociedade globalizada em
constituição, sem no entanto perdermos nossos elementos
de identidade nacional e muito menos sem desprezar problemas do nosso
sistema de educação, que vem sendo historicamente
reapresentados por não termos sido capazes de solucioná-los.
Nos tempos da internet, é preciso estar permanentemente atento a
construção de uma sociedade brasileira justa e inclusiva,
seja ela da informação, do conhecimento ou dos
serviços. A escola é a porta de entrada para a
concretização de um programa dessa natureza. Excluí-la por meio de políticas direcionadas ao aumento da largura de banda em detrimento da capilaridade seria perpetuar um erro, com tempo e oportunidades cada vez menores de recuperação.
Por Marcelo Giordan
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