FABIANA GITSIO
Cumprir os quase cinco meses de rodízio estadual sem se deixar abater
exige planejamento. Quem não tem um segundo carro precisa desdobrar-se
para dar conta dos compromissos e não sucumbir aos transtornos.
Vale rever os hábitos e mudar a rotina. A modelo Karla Ometto, da
Agência Elite, é taxativa. Só com trabalho garantido
sairá de casa às segundas-feiras, quando não pode
circular. Caso contrário, vai ficar assistindo à televisão
ou brincando com o cachorro. Os testes - uma média de três
a cada dia - só não serão sacrificados se estiverem
marcados em locais cobertos pelo metrô, considerado por ela o melhor
meio de transporte para situações de emergência. O
serviço de táxi é visto com restrições.
"É muito caro", reclama ela, que pode precisar deslocar-se de sua
casa, na Vila Mariana, na zona sul, para Santana, na zona norte, Alphaville,
na zona oeste, e Morumbi, de novo na zona sul. Tudo em um único
dia. Como teste não é trabalho, muitas vezes não compensa.
A hipótese dos ônibus está irremediavelmente descartada.
Ela cita como inconvenientes a superlotação e a demora -
no ponto e durante o trajeto. O maior transtorno, no entanto, ocorreria
na hora de voltar para casa.
"Ônibus é um incômodo", diz. Se nem sempre precisa ir "produzida" a um casting, sempre volta bastante maquiada. Karla já teve problemas com isso. "Alguns homens fazem muitas gracinhas", afirma ela, que tem 22 anos e está nos comerciais de TV da Yakult, Close Up, Banco Itaú e Tramontina. Carlos Junqueira, proprietário de uma empresa de congelados, está apreensivo. Às quartas e sextas-feiras terá de racionalizar os dois veículos que usa no comércio. "Não vou poder concentrar compras e entregas", diz ele, que teme perder clientes. Outra preocupação é com os prováveis atrasos de funcionários que dependem de condução. "O rodízio municipal é bem mais razoável", acredita. Sem desculpas - A estilista Paula Martins, proprietária de um veículo de placa final 8, já planejou: vai locomover-se de táxi. Serão muitas corridas. Embora fique durante toda a parte da manhã em seu ateliê, é obrigada a trabalhar também na rua. Tem de fazer compras na região do Bom Retiro e visitar a modelista, em Santo Amaro. "Se eu fosse empregada, talvez tivesse uma desculpa melhor, mas sou a dona do negócio e vou ter de me virar." O rodízio começa em uma época agitadíssima para Paula, que precisaria mais do que nunca do carro. Maio é mês do Phytoervas Fashion, evento no qual apresentará suas roupas pela segunda vez. O evento começa no dia 25, mas Paula já está trabalhando a todo vapor. "Tenho mil reuniões até lá", diz. Dois carros - A secretária Fernanda Pastore de Faro Mota, proprietária do Gol FER-1604, deixará de ir à academia de ginástica às terças-feiras, depois do trabalho. Isso porque ela estará pegando carona com a irmã, cujo carro tem placa com outro final. "Não faria sentido atrasar a volta dela para casa", diz. "Em dia de rodízio não dá para marcar nada depois do trabalho", reclama. Tudo é melhor para quem tem dois veículos. "Não tenho problema nenhum com o rodízio, que atrapalha a vida de muita gente", diz o zagueiro do São Paulo Márcio Santos, proprietário de um Audi conversível com placa final 6 e de um BMW, com final 7. Na quarta-feira circula com a BMW e na quinta com o Audi. Embora reconheça que a maioria da população não tem esse privilégio, Márcio Santos já notou que não são raros os casos de pessoas que têm adquirido um segundo carro mais barato apenas para driblar a medida. Ele já observara esse fenômeno em Roma, cidade que também faz restrição de veículos e onde há planos de financiamento "a perder de vista". "A longo prazo, o rodízio estadual não vai funcionar", arrisca. "A poluição vai continuar do mesmo jeito." Mesmo que não tivesse dois carros, Márcio Santos não se apertaria. Ele e seu companheiro de time Carlos Miguel moram no mesmo prédio. "Um daria carona para o outro na hora de ir para os treinos", conta. O jogador confessa ter mais simpatia pelo rodízio municipal. "Prejudica menos as pessoas." Nuvem de poeira - Na casa da modelo e atriz Cláudia Liz o número
de veículos também não é problema. A única
mudança à vista é que, às sextas-feiras, não
poderá buscar o filho Lucca no colégio. Situação
contornável, pois seu motorista vai fazê-lo com outro carro.
Sempre que precisar locomover-se nesse dia, Cláudia usará
seus serviços. Por considerar-se uma exceção, Cláudia
sente-se pouco à vontade para opinar sobre o rodízio. "Existem
pessoas que precisam ficar paradas e perdem dinheiro", diz. Mas gostaria
de ver a camada de poeira que cobre São Paulo desaparecer. "O pensamento
deve ser coletivo, não individual."
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